A radioterapia possui inúmeras implicações e efeitos adversos secundários à dispersão dos raios para além da região proposta para tratamento. Dentre as mais relevantes repercussões, está a injúria do tecido cardiovascular, que pode se manifestar com acometimento de qualquer componente do coração: miocárdio, aparato valvar, coronárias e sistema de condução. Em geral essas consequências só se traduzem em manifestações clínicas décadas após a exposição. Relato de Caso: Paciente masculino, 61 anos, com passado de doença linfoproliferativa de alto grau tratada com quimio e radioterapia torácica em 1989. Evoluiu 20 anos após tratamento com desenvolvimento de estenose aórtica calcifica grave e Estenose Mitral (EM) discreta secundárias a radioterapia. Submetido à troca valvar aórtica com implante de prótese metálica em 2009. Admitido em agosto de 2022 em pronto socorro cardiológico com dispneia aos mínimos esforços há um mês associado a anasarca. O ecocardiograma evidenciava disfunção ventricular direita não anteriormente observada, progressão da EM para importante (gradiente médio 7mmHg, área valvar 1.4cm²); complementação diagnóstica com tomografia cardíaca demonstrava adicionalmente extensa calcificação do aparato valvar, pericárdica e mitro-aórtica, além de aorta em porcelana (Figura 1; Figura 2).O paciente foi internado visando terapia cirúrgica para EM grave sintomática, porém evoluiu com deterioração clínica e choque cardiogênico dependente de dobutamina, e evoluiu a óbito antes da realização do tratamento cirúrgico proposto. Conclusão: Os achados de acometimento valvar responsáveis pelo cenário clínico crítico do paciente relatado correspondem fortemente às sequelas tardias decorrentes da radioterapia a qual o paciente foi exposto há 30 anos. Diante do aumento da sobrevida de pacientes oncológicos, as consequências das terapias em longo prazo serão cada vez mais observadas, se fazendo necessária a discussão quanto ao custo-benefício da racionalização do número de sessões e dose de radiação utilizada para tratamento; bem como encorajar a implementação de estratégias para rastreio e diagnóstico precoce, visando evitar reconhecimento tardio já sem possibilidade de tratamento.