Introdução: A hemocromatose hereditária é uma doença sistêmica, caracterizada por depósito de ferro em vários órgãos. O acometimento cardíaco geralmente inicia com cardiomiopatia restritiva e disfunção diastólica, com posterior progressão para dilatação e disfunção sistólica biventricular, além de arritmias. O objetivo é descrever um caso de cardiomiopatia por hemocromatose juvenil com remodelamento após terapia de ressincronização cardíaca (TRC) e tratamento da doença de base.
Relato de caso: Mulher, 40 anos, apresentando quadro de insuficiência cardíaca (IC) há 4 anos com dispneia progressiva e limitação funcional importante recente. Encaminhada ao pronto-socorro com quadro de sincope e frequência cárdica muito baixa. Antecedentes pessoais: fibrilação atrial paroxística CHA2DS2-Vasc 3 em anticoagulação oral com varfarina, diabetes mellitus tipo 2, artropatia, osteoporose, histerectomia por miomatose uterina em 1997, hiperpigmentação cutânea importante. Durante a investigação, ECG evidenciou bloqueio atrioventricular total com FC 42 bpm. No ecocardiograma, fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) de 40% com dilatação moderada de átrio direito, hipocinesia difusa, disfunção diastólica moderada, valva tricúspide com sinais de espessamento e retração com refluxo importante. A ressonância magnética cardíaca (RMC) demonstrou disfunção biventricular importante (FEVE 21% e fração de ejeção do ventrículo direito - FEVD - 25%) e depósito miocárdico importante de ferro (T2* estimado de 9 ms). Os exames laboratoriais confirmaram a sobrecarga de ferro e o exame genético demonstrou mutação no gene hemojuvelina, relacionada a hemocromatose juvenil subtipo 2A. Paciente foi submetida a implante de TRC, tratamento medicamentoso de IC, além de sessões de sangria e uso de quelante oral de ferro para tratamento da hemocromatose. Após 11 anos de seguimento, vem mantendo-se assintomática e com boa taxa de intervenção da TRC. Novo ecocardiograma com FEVE 67%, sem alteração segmentar, remodelamento concêntrico do VE e câmaras cardíacas de dimensões normais. Nova RMC com T2* estimado de 30 ms; FEVE 62% e FEVD 64%.
Conclusão: A hemocromatose hereditária é uma importante causa de IC, que pode ser reversível, especialmente se tratada precocemente e com boa resposta à TRC. A RMC tem papel não só no diagnóstico, como também prognóstico para avaliar a resposta ao tratamento.