Introdução:
A disfunção estrutural nas biopróteses valvares ocorre como resultado de calcificação, desgaste, formação de pannus, trombose e/ou endocardite podendo levar a estenose e/ou regurgitação. Descrevemos um raro caso de rotura completa de folheto de bioprótese valvar aórtica.
Descrição do caso:
Homem de 45 anos, com antecedente de troca valvar aórtica por doença reumática há 13 anos, foi admitido no pronto socorro com queixa de agravamento da dispneia há 15 dias, febre intermitente, tosse produtiva com expectoração purulenta e dor torácica ventilatório-dependente. Associado, havia edema de membros inferiores e perda ponderal de 4 quilos nos últimos dois meses. Ao exame físico, a pressão arterial = 110 x 70 mmHg e ritmo cardíaco regular taquicárdico (102 bpm). À ausculta: estertores crepitantes no terço inferior direito do pulmão e presença de sopro diastólico em foco aórtico 5+/6+. Ainda, edema de membros inferiores simétricos e hepatomegalia dolorosa. A ecocardiografia transesofágica mostrou dupla disfunção de prótese com ruptura de um de seus folhetos, ausência de vegetações e regurgitação central grave com gradiente médio de 51 mmHg e área valvar de 0,9 cm2 (Figura 1). PET-CT com captação em bases pulmonares (sugerindo pneumonia), sem evidência de endocardite. Prescreveu-se oxacilina e ampicilina por 7 dias e foi indicada e implantada prótese mecânica em posição aórtica. Surpreendentemente, durante cirurgia o folheto não coronariano não foi encontrado (Figura 2). Investigação adicional com angiotomografia computadorizada não conseguiu encontrar o folheto faltante. O anatomopatológico confirmou ruptura da válvula da bioprótese e demais folhetos com mobilidade reduzida e espessamento por acentuada infiltração lipídica e cristais de colesterol, bem como ausência de trombos. Não havia evidências anatomopatológicas de endocardite infecciosa. A paciente evoluiu bem, recebendo alta sete dias após a cirurgia.
Conclusões:
Nesse caso, o folheto completamente rompido curiosamente não cursou com sinais embolização e não foi encontrado na angiotomografia. Descartada a possibilidade de endocardite, a causa provável foi degeneração estrutural da prótese. Esse foi um dos poucos casos em que identificamos uma rotura total de folheto protético valvar em nossa instituição.
Figura 1: Imagem de ecocardiograma transesofágico evidenciando rotura de folheto não coronariano de bioprotese valvar aórtica.
Figura 2: Retirada da bioprótese valvar aórtica, demonstrando ausência do folheto não coronariano, associada a extensa calcificação.