Introdução: Dentre as diversas etiologias de insuficiência cardíaca, as doenças primárias do miocárdio (miocardiopatias) ocupam importante posição, sendo classicamente dividida nos fenótipos dilatada, hipertrófica e restritiva. Com a descoberta de espectros cada vez mais variados das miocardiopatias, associada a importância ascendente da pesquisa genética nesse cenário, fica claro a necessidade de ampliar os diagnósticos diferenciais antes subdivididos em fenótipos únicos.
Relato: Paciente do sexo feminino, 38 anos, com antecedente familiar de morte súbita precoce de 3 tios e 3 irmãos em acompanhamento no ambulatório do Instituto do Coração por miocardiopatia fenótipo hipertrófico (segmentos basais da parede inferior e anterior) e implante de cardiodesfibrilador implantável prévio, evolui com fraqueza muscular e mialgia global associadas a dosagem sérica de creatininofosfoquinase elevados. Solicitado teste genético com resultado positivo para os genes TPM1, variante genética de significado incerto (VUS) para miocardiopatia hipertrófica (CMH), e PYGM, variante patogênica para Doença de McArdle.
Discussão: O fenótipo hipertrófico sempre foi associado a CMH e cardiopatia hipertensiva, patologias de amplo domínio de cardiologistas e clínicos. Entretanto, faz-se cada vez mais necessário nesse cenário a investigação complementar das doenças de depósito como Amiloidose, Fabry, Pompe e McArdle. A paciente apresentada possui gene TPM1 (VUS) associado a fenótipo compatível com CMH, enquanto a doença de McArdle apresenta quadro neurológico devido a deposição de glicogênio em tecidos perifericos. A investigação complementar genética foi essencial para justificar acometimento sistêmico associado a CMH, antecipar paciente e equipe médica sobre futuro acometimento cardíaco secundário a Doença de McArdle (costuma ser a partir dos 60 anos), além de guiar o tratamento da paciente pela possibilidade de terapia específica, como reposição enzimática e acompanhamento multidisciplinar do caso.