Paciente 64 anos, sexo feminino, hipertensa, história de “infarto do miocárdio” há 18 anos. Refere ter se submetido a cateterismo cardíaco na ocasião do infarto, porém nega implante de stent. Relata que há 6 meses apresentou episódio de palpitações associadas a dor torácica em aperto, desencadeadas após esforço moderado. Tal quadro a motivou a procurar o pronto socorro, onde foi diagnosticada com taquiarritmia, tratada com cardioversão elétrica. Após este episódio, apresentou episódios esporádicos de palpitações associadas a dor torácica (cerca de 5 minutos de duração). Adicionalmente, passou a apresentar edema de membros inferiores e dispneia aos esforços, com piora progressiva, chegando a classe funcional (CF) III pela NYHA, motivando encaminhamento a serviço de referência terciária para investigação.
Eletrocardiograma: ritmo sinusal, bloqueio de ramo direito, área elétrica inativa inferior e ântero septal e supradesnivelamento do segmento ST de V2-V4. Ecocardiograma: Fração de ejeção do ventrículo esquerdo (VE) de 40%, às custas de hipocinesia do septo inferior basal e médio e de discinesia de toda a região apical com conformação aneurismática.
Indicado cateterismo cardíaco, porém a paciente recusou o procedimento. Optado então por realizar angiotomografia de coronárias (ATC), que evidenciou ausência de doença aterosclerótica significativa e presença de ponte intramiocárdica em segmento médio de artéria descendente anterior com profundidade de até 3mm, além de aneurisma apical do VE associado a fina faixa hipoatenuante sugestiva de sequela de infarto prévio.
Holter de 24 horas demonstrou baixa densidade de extrassístoles ventriculares (<1%), e ausência de taquiarritmias. Sorologia para chagas negativa.
Após otimização do tratamento clínico com carvedilol, enalapril, espironolactona, furosemida em doses otimizadas, houve melhora importante dos sintomas anginosos e da CF, atualmente em CF II, um novo ecocardiograma foi realizado após 2 anos com melhora da fração de ejeção para 44%. Realizou teste ergométrico, que demonstrou ausência de isquemia e desempenhou 8,4 METs.
Este relato de caso demonstra a associação rara entre trajeto intramiocárdico profundo da artéria descendente anterior e áreas sequelares de infarto miocárdico, em território a jusante da ponte miocárdica, levando à disfunção sistólica do ventrículo esquerdo e consequente insuficiência cardíaca. A relação causal entre a ponte miocárdica e as anormalidades cardíacas encontradas é altamente provável diante da localização das áreas sequelares e da exclusão de outras etiologias.