Introdução: a valva mitral (VM) é composta pelos folhetos anterior e posterior, que se ligam, por cordoalhas tendíneas, a dois músculos papilares (MP): anterolateral e posteromedial. Contudo, a separação incorreta da crista trabecular pode fazer com que os predecessores embrionários dos MP se condensem em um único MP, promovendo a "abertura em paraquedas" da VM. Em geral, essa se associa a outras alterações congênitas, como no complexo de Shone, sendo diagnosticada ainda na infância. Encontra-se isolada, porém, em até 1% dos casos, com diagnóstico mais tardio. No adulto, pode evoluir com disfunção da VM. Relato de caso: paciente de 40 anos, sexo feminino, sem antecedentes mórbidos conhecidos, apresenta-se com queixa de palpitações acompanhadas de dor torácica em aperto para esforços extra-habituais. Nega dispneia, ortopneia ou dispneia paroxística noturna. Ao exame, apresentava ritmo regular, primeira bulha hiperfonética e sopro regurgitativo protomesossistólico em foco mitral (intensidade +/6+), sem estase jugular, sem visceromegalia ou refluxo hepatojugular, extremidades bem perfundidas. Radiografia de tórax demonstra presença de 4º arco e aumento dos hilos pulmonares. Ao eletrocardiograma, apresenta ritmo sinusal e sinais de sobrecarga de átrio esquerdo. Sem alterações laboratoriais relevantes. Realizado ecocardiograma transtorácico que apresenta: aumento importante de átrio esquerdo (volume estimado de 50 ml/m²); VM com redução importante da abertura das cúspides por MP único (ausência de MP póstero-medial), sugestivo de VM em paraquedas, gradiente médio de 14 mmHg, área valvar de 0,6 cm² e insuficiência discreta; pressão sistólica de artéria pulmonar (em repouso) de 59 mmHg. Discussão: a VM em paraquedas é uma alteração morfológica rara que deve estar entre os diferenciais ao avaliarmos pacientes com lesões importantes de VM. Quando indicada intervenção no adulto, a troca valvar cirúrgica é a preferência, uma vez que valvoplastia por cateter-balão, plástica valvar cirúrgica e implante valvar percutâneo são procedimentos tecnicamente não aplicáveis nessa população de pacientes. Conclusão: apesar de infrequente, o reconhecimento da morfologia da VM em paraquedas como etiologia de disfunção de VM no adulto impacta diretamente na escolha da intervenção